segunda-feira, 5 de novembro de 2012

ÁGUA SALGADA INVADE O BAILIQUE

Vila Progresso - Principal comunidade do Arquipélago do Bailique

Assoreamento dos rios do Bailique
Depois de um cansativo dia de trabalho, seu Manoel chega em casa, e com muita fome, vai logo pegando a tigela para fazer o pirão de açaí para comer com camarão. Para sua surpresa na sua primeira colherada sente algo estranho. Indignado pergunta à esposa se esta havia colocado sal no açaí. Depois de algumas horas, seu Manoel percebe que não se tratara do desleixo de sua esposa. O açaí estava salubre devido a água usada para o seu preparo. E com o mesmo gosto estava a água de beber e tudo o que dela havia sido feito. Desesperado seu Manoel foi até o rio, provou da água e confirmou sua suspeita... Bem que este trecho poderia ter sido extraído de um romance de ficção ou de alguma história ocorrida na Vila do Sucurijú, no município de Amapá. Mas, trata-se de um fato real que está ocorrendo no Arquipélago do Bailique.
 
O Arquipélago do Bailique, distante cerca de 150 km da capital amapaense é formado por sete ilhas e possui aproximadamente 7.000 habitantes, distribuídos nas diversas comunidades ribeirinhas que compõem o distrito macapaense. Localizado na foz do Rio Amazonas, o arquipélago está de frente para o Oceano Atlântico. Apesar dessa proximidade com o oceano, a invasão das águas salgadas deixou de ser um problema para a população bailiquiense há mais de meio século. Com o tempo, as ilhas cresceram e a costa bailiquiense juntamente com a força do Rio Amazonas empurraram as correntes oceânicas para bem distante do Bailique.

Muro construído para proteger a comunidade das caídas 
Mas, o oceano sentindo-se expulso do paraíso preparou sua revanche de forma triunfal. Armou uma estratégia que nem o mais esperto inimigo pudesse suspeitar. Sentindo-se impotente para atacar de frente, o Oceano Atlântico se alia ao Rio Araguari e dispara suas águas no interior do arquipélago. Com a potência de uma bomba, a água salgada do oceano está expulsando a água doce do Rio Amazonas e invadindo o arquipélago, num movimento que vai do centro para as costas do arquipélago.
 
Como bem sabemos, o Rio Araguari deságua no Oceano Atlântico. E através de sua foz, recebe água oceânica que invade boa parte do rio. O choque da água oceânica com a água do Rio Araguari está fazendo com que a água salgada seja desviada por canais até os rios do Bailique. Há forte suspeitas de que a criação de bubalino na região do Araguari esteja relacionada com o surgimento desses canais que estão interligando o Rio Araguari com a região do Bailique. E há quem diga ainda, que a construção da hidrelétrica no leito do Rio Araguari, próximo ao município de Ferreira Gomes, esteja interrompendo o fluxo normal do rio e desviando seu curso para os canais que deságuam no Bailique.


Vegetação litorânea sendo arrastada pela correnteza das marés
Apesar de serem suposições empíricas, tais hipóteses podem ter algum fundamento científico. De uma forma ou de outra, o fato é que as águas salgadas estão invadindo o arquipélago e trazendo sérias preocupações para a população daquela região. A força da água vinda do Rio Araguari é tamanha que está provocando uma grande caída de terras e levando para a água dezenas de casas e até comunidades inteiras. Se por um lado provoca a caída de terras, por outro, provoca o assoreamento de outros rios, principalmente dos canais por onde poderiam passar as águas doces do Rio Amazonas.

Outro problema que poderá trazer sérias consequências  está relacionado ao  ecossistema. Já foram identificadas algumas espécies específicas da região do Araguari dentro do arquipélago bailiquiense, provando que a invasão das águas salgadas poderá provocar um grande desequilíbrio ecológico na região. Podem surgir novas espécies como também pode provocar o desaparecimento e até a extinção de outras.
 
Até agora não se tem uma real dimensão do problema. O que sabemos é que os comércios locais estão sendo abastecidos de água mineral, cena típica de oportunismo diante uma situação catastrófica. Oremos para que não seja o caso.

Caída de terras provocada pela corrente das marés