Sabe
aquele ditado que diz assim: “Quem vê cara não vê coração”? Pois é, serve para
caracterizar quem aparenta ser uma pessoa, mas que no fundo é outra totalmente
diferente.
Essa
poderia ser a definição perfeita para sintetizar a personalidade desse senhor,
cuja história vou ousar contar-lhe. Tentar contar, porque ninguém neste mundo
já ouviu sua história por completo. Como ele mesmo dizia, “tem coisas que não
devem ser ditas”. Mas não se frustre, caro ouvinte, porque o que ele conta é o
suficiente para você não querer saber o restante da história.
Seu
nome, David Dubin, talvez você nunca tenha ouvido este nome em sua vida, mas
com certeza já conhece este senhor das propagandas de TV. David era um judeu
com dupla nacionalidade e personalidade. Polonês de criação e brasileiro por
falta de opção. Veio ao mundo em 1913, no alvorecer da primeira grande guerra.
Como não bastasse ter nascido judeu numa terra que lhe negava, a vida ainda lhe
reservara crescer no campo de batalha.
Batalha
que lhe tirou o pai de sua vida quando ele era ainda um inocente garotinho de
cinco anos. Esta mesma guerra que mais tarde lhe roubaria a mãe, a esposa, a
filha de colo... Tudo o que ele tinha, tudo o que ele amava, tudo o que ele
era.
Com
a guerra, conheceu e viveu todos os horrores da vida. Viu e experimentou as
maiores atrocidades que um ser humano pode cometer ao seu semelhante. Guerra,
onde os amigos viram inimigos, onde um mata o outro e todos se matam. E ele, o
David, também tinha mil motivos para matar e morrer. E quase morreu e quase
matou, quase se matou. Um homem que decidiu ficar, que resolveu lutar, que
fugiu. Fugiu para a vida. Viver, pelos seus, era o mínimo que podia fazer. Era
a sua vingança!
No
Rio de janeiro, longe dali, longe de ninguém, trouxe alguém, uma família para
dividir o peso da solidão, para se curarem de uma ferida que nunca cicatrizará.
Enfim, uma nova vida. Nova no sentido figurado, porque na realidade é
impossível esquecer o que ficou para traz. Ele dizia que fazia questão de não
esquecer nada. Essa era a sua energia, o motor que engrenava a sua vida. Porque
esquecer era aceitar o acontecido como algo natural.
Portanto,
se você chegou a ver o David nos comerciais de Tv, sempre sorridente, saudável.
Você jamais desconfiaria que é o mesmo personagem real desta história. E quando
alguém o encontrava pelas ruas e o saudava perguntado como o senhor vai, seu
David, ele sempre respondia: “Tá tudo bem! Tem outros que estão pior”. Ele
dizia que o racismo é um câncer mundial que precisa ser enfrentado.
E assim
ele viveu o resto de sua vida, até os 90 anos. David Dubin, o homem de duas
vidas, de duas almas e um só coração.
ESTA
CRÔNICA É INSPIRADA NA OBRA “O VELHINHO DOS COMERCIAIS”, PUBLICADA NO LIVRO “A
VIDA QUE NINGUÉM VÊ, DE ELIANE BRUN”.
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