sexta-feira, 4 de outubro de 2013

A CRÔNICA DOS CENTAVOS



Hoje ao sair de casa para a labuta diária, um fato me chamou a atenção. Eu tirei o carro da garagem, desci para fechar o portão e um objeto brilhante ofuscou meus olhos. Estava ali, dentro de um pequeno córrego que passa em frente de casa. Como bem sabemos a cidade de Macapá praticamente não tem saneamento básico e o esgoto é assim, a céu aberto. Mas o fato é que aquele pequeno objeto continuava a brilhar. Aproximei, agachei-me e vi que era uma moeda, uma moeda de cinquenta centavos. Dava pra ver direitinho sob a água fedida e corrente daquele esgoto. Quis pegar a moeda, mas uma recordação me veio à memória. Uma recordação que me fez lembrar que nem sempre “dois mais dois é quatro”. Há uns anos atrás esta moeda teria um grande valor em minha vida, muito mais do que vale hoje.
Quando eu era adolescente, teve um dia que saí para a escola com apenas o dinheiro da passagem da ida. Para a volta me faltavam dez centavos. Mas mesmo assim eu fui. Eu tinha esperança que tudo desse certo. Na escola não quis pedir dinheiro emprestado para ninguém, talvez meus colegas nem tivessem. E aí quando eu saí a minha preocupação era somente uma: encontrar uma moeda de dez centavos. Eu tinha que encontrar dez centavos...
Vejam bem, a passagem do ônibus não custava dez centavos, mas se não tivesse aqueles dez centavos eu não voltaria para casa de ônibus. E a escola era bem longe. De ônibus eu gastava cerca de 30 minutos. Quanto tempo eu gastaria a pé? Não queria nem pensar nessa possibilidade!
Saí andando pelas ruas de cabeça baixa, quem sabe eu encontraria os dez centavos. Qualquer um que passasse por mim e me visse cabisbaixo pensaria que eu estava triste, cansado. Na verdade eu estava sentindo tudo isso, mas o que eu queria mesmo era encontrar uma moeda de dez centavos. Engraçado que quando a gente não está procurando elas aparecem, mas quando a gente está precisando as danadas se escondem, só para ver o mal da gente, será?
E aí as esquinas se passavam e a esperança continuava viva: na próxima eu encontro. E depois de duas horas de caminhada naquele sol intenso do meio do mundo, adivinhem, cheguei em casa morto de cansado e sem os benditos dez centavos.
Gente, esses cinquenta centavos que eu estou a olhar, naquele tempo valia ouro para mim. Hoje, talvez eu não precise dele tanto quanto alguém possa precisar. Cinquenta centavos valem muito pouco para quem ganha bem, mas é um tesouro nas mãos de quem não tem o que comer. Por isso, eu voltar para o carro e vou deixar essa moeda no mesmo lugar, talvez a pessoa que vá apanhá-la precise dela mais do que eu.

Por Paulino Barbosa

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